sexta-feira, 30 de março de 2007

Anastassia Bardina


Amazing ! Esta grande Senhora deixa-me uma enorme vontade de também querer ser "Bardino"

segunda-feira, 26 de março de 2007

De viagem


Os "Contos Estelares" vão parar por uns dias, porque vou viajar - por acaso passo em Barcelona, mas ainda não é desta que lá fico a algum tempo e Barcelona não é para ser vista à pressa.

Lá no sítio para onde vou talvez escreva alguma coisa, depende dos fluidos. Até lá, deixo-vos um abraço e votos de uma boa Páscoa.

quarta-feira, 21 de março de 2007

Con te partiro - Andre Bocceli

Andrea Bocceli
Con te partiro


Quando sono solo
Sogno allorizzonte
E mancan le parole
Si lo so che non ce luce
In una stanza quando manca il sole
Se non ci sei tu con me, con me

Su le finestre
Mostra a tutti il mio cuore
Che hai accesso
Chiudi dentro me
La luce
Che hai incontrato per strada.

Con te partiro
Paesi che non ho mai
Veduto e vissuto con te
Adesso si li vivro

Con te partiro
Su navi per mari
Che io lo so
No no non esistono piú
Con te io li rivivro.

Quando sei lontana
Sogno allorizzonte
E mancan le parole
E io si lo so
Che sei con me con me
Tu mia luna tu sei qui con me
Mio sole tu sei qui con me,
Con me, con me, con me.

Con te partiro
Paesi che non ho mai
Veduto e vissuto con te
Adesso si li vivro

Con te partiro
Su navi per mari
Che io lo so
No no non esistono piú
Con te io li rivivro

Con te partiro
Su navi per mari
Che io lo so
No no non esistono piú
Con te io li rivivro
Con te partiro.

Io con te.

terça-feira, 20 de março de 2007

Contos Estelares - XIV

Ai, Manolo !

“Ó Cem, com coisas sérias não se brinca”, repreendeu Augusta, ainda rindo com as caretas que Cem fazia a tentar explicar-se. “Augusta Nina juro que por uma vez estou a falar a sério – há um tipo chamado Manolo que me pergunta em Morse quem somos; diz que está no 4º planeta rodando em cima de um sol que nós conhecemos por XV8 e parece que é tão humano como nós”, protestou Cem, que quando se concentrava com grande intensidade não conseguia deixar de fazer caretas. Augusta não teve tempo de responder: dessa vez era mesmo o alarme geral da nave a soar estridentemente, anunciando que o computador tinha encontrado algo que parecia um planeta habitável. Neves, Cleópatra e Funes apareceram de repente na sala de comando e imediatamente se inteiraram dos últimos acontecimentos. Cem enfiou os dados no computador que quase de seguida cuspiu uma folha impressa com os dizeres “Sol XV8, 4º planeta, todas as condições para sobrevivência humana; sinal electrónico recebido em código binário, muito complexo – prossegue operação de descodificação”. Cleo teclou indagando do computador para quando se previa a a descodificação do sinal electrónico e o computador respondeu “entre 1 semana a 15 dias”. Nos 10 dias seguintes todos esperaram civilizadamente, sem exteriorizarem a excitação que os ia possuindo; os meses passados na nave tinham criado entre todos um laço especial que envolvia delicadeza, afecto, entre-ajuda, confiança e –pasme-se ! – igualdade. Até Cleópatra, a mulher mais radical, tinha acabado por reconhecer que naquelas condições os homens podiam ser tão importantes como as mulheres; tinha tido uma discussão com Cem sobre o Dia do Pai e ficou algo surpreendida quando compreendeu que afinal Cem pensava o mesmo que ela; mas foi preciso engolir algum orgulho para aceitar que um simples homem pudesse pensar com o mesmo acerto que ela. “Manolo ?”, dizia Neves, “mas isso lembra-me qualquer coisa...” e não explicava o quê, apesar da curiosidade dos outros. Até que, ao 10º dia o computador despejou o sinal descodificado: “Sou Manolo, astrónomo e cientista estagiário, estou a contactar-vos à revelia dos meus chefes, sei que vocês estão a dirigir-se para cá numa nave espacial de extraordinária potência, a uma velocidade próxima de 20 vezes a velocidade da luz e pelos vossos sinais parecem-me humanos ou pelo menos humanóides; cuidado com o 10 planeta do nosso sistema, está armadilhado contra os Cylons, nossos inimigos tradicionais, andróides hostis e tecnologicamente muito avançados; o planeta emite um feixe tractor convidando as naves a poisar – esse feixe tractor é uma armadilha; pelas minhas contas, se vocês mantiverem a velocidade a que estão, entrarão no nosso sistema dentro de uns 7 meses; não tentem contactar comigo por agora; mas estejam descansados, pois muito antes de estarem bem próximos serão oficialmente contactados pelos mais altos responsáveis do planeta”. “Ai, Manolo, que saudades”, suspirou Neves misteriosamente. (continua)

Contos Estelares - XIII

Estava Andrómeda muito bem posta em sossego...

A face nocturna do planeta dormia, com algumas excepções.
Alguns profissionais ligados à astronomia observavam excitados o enorme visor do telescópio apontado para o infinito.
Poucos dias antes um astrónomo estagiário tinha descoberto um sinal electro-magnético estranhíssimo vindo de uma zona estelar consabidamente vazia.
Depois de ter submetido o sinal a múltiplas experiências, o jovem astrónomo chegou à conclusão de que só uma entidade com inteligência o poderia produzir; na verdade, os impulsos eram rítmicos e repetiam-se pela mesma ordem: três pontos seguidos de três traços, de novo três pontos; depois de uma pausa recomeçava a mesma série.
O computador disparou no écran a constante conhecida correspondente à variável que o cientista introduzira:
3 pontos – S; 3 traços – O
A sequência - 3 pontos – 3 traços – 3 pontos – representava a sigla SOS.
O computador indicou que aquela era uma velha fórmula usada num planeta lendário para se pedir socorro.
Tratava-se do planeta Terra, que alguns “crentes” continuavam a defender que sempre existira nas proximidades do braço da espiral, rodando em torno de um sol que há pouco tempo se tinha tornado numa super-nova.
Havia mesmo quem defendesse que os homens de Andrómeda descendiam dos terrestres, o que ultrapassava toda a especulação conhecida e entrava pelo caminho do esotérico.
Nesse planeta existia uma língua bastante espalhada, que era o inglês – o SOS era o acrónimo da expressão inglesa “save our souls”, um pedido de ajuda universal.
Manolo, assim se chamava o jovem cientista estagiário, deu conta aos seus superiores do que se passava e estes começaram por dizer algumas piadas ao jovem, até que o Dr. Roldán, chefe do serviço de astrofísica do Observatório, se dignou examinar os documentos com mais atenção.
Descobriu quase de seguida que o jovem quase de certeza tinha razão.
De facto, para além dos sinais constantes e da explicação oferecida pelo computador, o próprio sinal electro-magnético se tornava mais forte de dia para dia; e quando chegou a mensagem “Olá – há alguém em Andrómeda ?” escrita naquele código de pontos e traços e vinda exactamente do centro da onda electro-magnética, Francis Roldán não teve dúvidas.
“Hombre, esto es magnifico” disse ele em castelhano ao jovem (quando se excitava Roldán disparava frases na antiga língua que chamavam castelhano, em vez de se exprimir civilizadamente em esperanto, como era normal).
Roldán quis responder imediatamente ao sinal, mas os seus companheiros seniores dissuadiram-no disso, pois além de não haver no Observatório um projector com força suficiente para enviar a mensagem, todos queriam saber mais acerca da inteligência que aí vinha antes de eventualmente se lhe abrir o jogo.
Na verdade todos sabiam que o sinal provinha de uma zona algures a 15 anos luz de distância, só podia vir de uma nave espacial – e só uma nave espacial com um potencial formidável seria capaz de emitir sinais a 15 anos luz de distância.
Uma nave que possivelmente podia destruir planetas.
(continua)

domingo, 18 de março de 2007

Dia do Pai

É a 19 de Março.
Vivemos numa sociedade algo estupidificada em que raramente paramos para pensar.
Afinal quem é o Pai, o que é o Pai ?
A única pessoa que ganha dinheiro lá para casa ?
Ou aquele que ganha mais ?
A pessoa que passa os cheques ?
O factor de segurança ?
O carrasco de serviço quando a(s) criança(s) se torna(m) insuportável(eis) ?
O encarregado da “distribuição da fruta” ?
A pessoa distante que sai de manhã e volta à noite, tendo pouco contacto com os filhos ?
O motorista de serviço que vai levar e buscar as crianças à escola ?

Ou

É a pessoa capaz de pacificar uma alminha aflita de miúdo ?
A pessoa que aparenta ter força para defender tudo e todos do mal ?
A presença tranquila de quem sabe explicar o mundo ao filho ?
O companheiro de momentos de distensão com a mulher e filhos ?
O entusiasta que convida toda a gente para uma borgazita fora de casa ?

Depois de muitos séculos de hiper-valorização do papel do pai, assistimos nos últimos 40 ou 50 anos ao fenómeno inverso – a constante valorização da mãe e a constante desvalorização do pai.
É tempo de retomar uma posição de equilíbrio.
Com votos de que todos saibam reconhecer aos pais o seu espaço.
E de que todos os pais o saibam ocupar.

Rust Never Sleeps

Yes, a ferrugem nunca dorme. Este é o tema geral de um LP de Neil Young, onde avulta a canção Hey, Hey, My, My.
Neil Young foi um dos meus heróis.
Hoje ouço-o menos, especialmente quando vou de carro, para não apanhar com bocas escarninhas da mulher e das crianças tipo "lá vem o Neil Young outra vez" (pronuncia-se Nêêiil, à moda cá de casa, o que me deixa varado e revoltado).
Neil canta o amor que nunca veio, a mulher que a vida tinha prometido mas que ficou nalguma curva da vida, a precaridade de tudo isto, o logro da droga pesada ("every junkie is like a setting sun"...) e outros temas bastante actuais.
Tudo isto, no fundo, é por vezes algo
helpless.

sábado, 17 de março de 2007

Leituras do passado

Estou a reler uma obra sobre Harun-Al-Rachid que me está a deliciar, por duas razões: por causa do próprio conteúdo do livro e por causa dos meus comentários feitos há 20 anos, quando o comprei.
Durante muito tempo (e por vezes ainda hoje) cultivei uma prática interessante – ir fazendo comentários à margem nos livros que ia/vou lendo.
Naturalmente que só comentava/comento livros que me parecem especialmente interessantes.
Os meus comentários de jovenzinho recém-chegado à idade da razão, são extremamente “frescos”, em todos os sentidos, mas são também de uma ingenuidade espantosa.
São dois livros em um: a pompa do califado de Bagdad e a vivacidade do jovem bem disposto que eu costumava ser.

Frase de antologia

"Os teus sabem-se sempre a coentros".
Frase de Salazar comentando a diferença de sabores entre os lusitanos peitos de D. Maria e alguns peitos franceses onde ele foi beber a (pouca) cultura internacional que tinha...bom, poderia não ser propriamente internacional, mas era pelo menos e seguramente transfronteiriça.
Obtido no impagável Funes El Memorioso.

O meu amigo "Quatro"

Um belo dia, estava eu no 3º ou 4º ano do Liceu, um colega teve necessidade de confirmar uma questão comigo; telefonou lá para casa; atendeu uma das minhas irmãs mais velhas, que ficou hororizada com a conversa:
"Sim, daqui fala um colega, poderia falar com o A..., por favor "?
"Com certeza, diga-me quem fala, por favor".
"Fala o Quatro !"
Nunca mais consegui deixar de pensar nesse colega sem o associar ao quatro.
E a minha irmã nunca mais parou de me gozar com bocas tipo "olha lá, ó 14, vê lá se tens juízo"...
Quem diria que eu mais tarde iria chegar a... Cem.

terça-feira, 13 de março de 2007

Adolescente


Hoje o meu filho faz anos.


Parabéns, filhote !


É a minha vez de dizer que se não existisses tinhas que ser inventado...

Ó filhote, gosto tanto de ti !


Uma história espectacular que ouvi ontem na rádio e que me fez “partir o coco”:

Um entrevistado cujo nome não retive, ao descrever a sua relação de amor com o filho pequenito, contou que um dia o foi deitar e depois de muitos miminhos, já a despedir-se disse-lhe “ó meu filho, gosto tanto de ti”, ao que o miúdo, meio ensonado, respondeu “pois, pai, eu também gosto muito... da mãe !”

domingo, 11 de março de 2007

Palavras sábias


"Nunca te metas com uma miúda que já te bateu uma vez" - Pedro - 9 anos.

(Obtido no
Gabinete de Tempos Livres).

O miúdo tem carradas de razão.

E é bastante precoce, podem crer.

Contos Estelares - XII

Somewhere in outer space

Augusta acordou com a sensação estranha de estar a acordar num local desconhecido.
Durante um momento conjecturou onde estava, para logo depois se lembrar que estava a bordo da “Poseidon” a caminho da nebulosa de Andrómeda.
O seu livro de poesia jazia no chão, atraído pela gravidade artificial criada pelos motores da nave.
Os seus últimos pensamentos antes de adormecer voltaram: “sou agora um dos raros sobreviventes da espécie humana, as responsabilidades que antes tinha multiplicaram-se infinitas vezes”.
Carregou num botão do painel frontal do quarto e verificou que todos os tripulantes estavam ainda nos seus camarotes; Neves e Cem estavam já acordados, Cleópatra e Funes não davam quaisquer sinais.
“Bom dia, companheiros !” disse Cem Anos no intercomunicador, “devem estar com tanta fome como eu, dentro de 20 minutos tenho pronto um pequeno almoço para todos”.
Augusta sorriu e pensou “este ao menos não perde o apetite”.
Passado um pouco estavam os três no refeitório comendo ovos mexidos com bacon e bebendo um café especialmente aromático.
“Que belo cheirinho”, disse Cleópatra entrando no refeitório.
“Pois, sabe que é de manhã que se começa o dia..., aprendi na tropa”, disse Cem.
Cleópatra não se fez rogada; quando já ia na segunda rodada de ovos com bacon e na segunda vezada de café surgiu Funes, igualmente faminto e imediatamente presenteado por igualmente suculento pequeno almoço.
Reuniram depois na sala de comando.
O céu de estrelas tinha-se modificado totalmente: a nebulosa de Andrómeda continuava focada à frente, mas as estrelas por que tinham passado e o panorama daí alcançável era o de um emaranhado de sistemas muito pouco familiar.
Tinham passado cerca de 20 horas-padrão (tempo da nave), desde que se deitaram, mas esta tinha percorrido muitos milhões de quilómetros.
A uma velocidade de 20 vezes a velocidade da luz a nave tinha percorrido cerca de 4.000 horas/luz, quase 17 dias/luz, no mesmo período.
Sendo o tempo padrão baseado na velocidade da luz, uma aceleração de 20 vezes a velocidade da luz provocava uma correspondente aceleração no tempo.
Os astronautas verificaram que a nave tinha funcionado normalmente, reagindo a todos os estímulos adequadamente; a própria nave não accionou qualquer alarme despertador dos tripulantes porque os problemas encontrados foram sendo resolvidos pelos computadores.
Estavam a navegar a uma velocidade espantosa, qualquer coisa como 6 milhões de quilómetros por segundo; a essa velocidade o mundo exterior não era visível das escotilhas da nave, mas os computadores apresentavam-no em simulações perfeitas.
Sem a assistência dos computadores as escotilhas apresentariam todas o mesmo aspecto: um negro profundo.
Os “scanners” estavam constantemente a funcionar, varrendo o espaço em todas as direcções, pois apesar do destino ser Andrómeda os astronautas não enjeitavam a hipótese de ficarem num mundo habitável que descobrissem no caminho.
Da estação chegaram notícias de que tudo estava a correr bem, incluindo o estado de sono profundo das cerca de 500 pessoas que no seu conjunto as naves traziam – todos em sono profundo e em solução criogénica.
Marta e João davam boa conta do recado, mas havia planos para acordar mais gente, pois apesar de as tarefas serem muito facilitadas pela mecanização e pela robotização, algumas acções de comando da estação deveriam ser executados por humanos.

quinta-feira, 8 de março de 2007

Contos Estelares - XI


João Pestana não desgruda.

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terça-feira, 6 de março de 2007

Contos Estelares - X

Into deep space

Cada um foi para o seu camarote instalar-se confortavelmente. O piloto automático, controlado pelo computador central, estava a trabalhar em pleno sendo desnecessário por enquanto cuidados humanos na navegação.
Augusta Nina recostou-se bem na cama, puxou de um livro de poesias e começou a sua leitura preferida; daí a pouco cairia num sono reparador, característico das almas justas.

Cleópatra preferiu ouvir música e colocou no aparelho de CD/DVD o inevitável Rodrigo Leão.
Pensativa, meditou no que tinha deixado para trás, não na Terra, mas na estação espacial – espaço à farta, pouco trabalho, sistemas automáticos ultra-sofisticados, comida boa a horas e descanso quando queria; sentia que tudo iria mudar agora - e não estava segura de que seria para melhor. Cleópatra estava muito contrariada por ter que partilhar responsabilidades com Funes e Cem; não era antipatia, até lhes achava piada, mas tinha a sensação fatal de que a sua inferioridade histórica de sexo fraco viria ao de cima cedo ou tarde e poderia trazer-lhes sarilhos a todos; o (mau) material tem sempre razão !, pensava ela, preocupada.
Funes escolheu três catrapázios de História contemporânea e retirou-se para os seus aposentos.

Neves já dormia no seu camarote, quando Cem se resolveu a deixar a sala de comando (tinha ficado até ao último momento, verificando e re-verificando a certidão das coordenadas do computador; não seria grave, mas seria desagradável ter que reajustar alguns graus a trajectória da nave, se a direcção inicialmente tomada não fosse inteiramente correcta.
Foi para o seu camarote e finalmente deitou-se: parecia-lhe mentira estar envolvido numa aventura daquelas como que por acaso. Pegou num livro, “O Enigma de Aristóteles”, tirou a roupa exterior ficando apenas com a roupa-pele (roupa finíssima que aderia ao corpo quase sem se dar por ela, feita de uma fibra que era uma mistura de algodão e linho, super-confortável), estendeu-se na cama com cuidado (a malfadada hérnia discal andava um pouco assanhada e ele tinha que tomar cuidados, dormindo sempre em colchão duro e de barriga para cima, sem almofada), ajustou o livro ao aparelho de leitura que tinha inventado uns anos antes – e começou a sua leitura terapêutica.
Durante o período de treino e preparação, tinham acordado em que a nave seria governada por um triunvirato em rotativismo, cabendo naquele momento o governo a Neves, Cleópatra e Funes; dentro de 1 mês Funes cederia o lugar a Augusta, dentro de 2 meses Neves cederia o lugar a Cem, dentro de 3 meses seria Cleópatra a ceder o lugar a Funes.

“Consegue ler ?”, indagou Cleópatra pelo intercomunicador.
“Bem, ainda não, mas não tarda; já coloquei o meu aparelhómetro e...”

“Pois é isso, Cem, creio que o ouvi dizer que tinha uma aparelho para leitura...”

“E tenho – construí-o na praia, a partir de um suporte de harmónica”.

“Você era capaz de me construir um aparelho desses ?”, perguntou Cleópatra um pouco a medo.

“Claro, Cleópatra, por acaso até tenho comigo mais um aparelho desses, o primeiro protótipo que fiz, espere aí que eu já lho dou” – passado pouco tempo Cem passou no camarote de Cleópatra e entregou-lhe o aparelho; explicou-lhe como funcionava e voltou aos seus aposentos.

Deitou-se e começou a ler.
Passado uma meia hora começou a sentir sono.
Antes de adormecer ligou o computador para ver se estava tudo em condições.

Tudo estava normal.
Na parte das mensagens internas viu uma mensagem de Cleópatra que lhe era dirigida e sorriu ao ler “reconheço a eficiência do seu invento; como é que se chama ?” Cem teclou rapidamente duas palavras: “Cem Letras”.
O silêncio foi tomando conta da nave – João Pestana poisou suavemente no tombadilho.

La poesia es una arma

Paco Ibañez

Gabriel Garcia Marquez

Faz hoje 80 anos.
O seu livro mais extraordinário, Cem Anos de Solidão (Cien Años de Soledad) será recordado como uma das mais belas obras representativas do Realismo Mágico Latino-Americano, que marcou várias gerações de leitores.

Gabriel Garcia Marquez é colombiano e Prémio Nobel da Literatura.

Aqui ficam algumas obras dele, a reboque das releituras de Arnaldo Nogueira.

Tenho para mim que Gabo é um dos homens mais extrordinários do seu tempo.

Não foi por acaso que me inspirei no seu nome, quando escolhi uma identidade virtual para este blog e para a intervenção em alguns outros.

Saravá, querido Amigo !
(E obrigado por tudo o que me ensinaste e por tudo o que me deste a sentir).

segunda-feira, 5 de março de 2007

Juventude “inconciente”


Hoje tropecei numa canção dos Eagles e lembrei-me da minha juventude inconsciente.

Tinha 28/29 anos, era um jovem profissional cheio de confiança em si próprio, saído de um “namoro histórico” (daqueles que leva uns anos largos e depois não dá em nada por absoluta incompatibilidade de feitios...) e... estava cheio de pena de mim próprio !
(Ter confiança em mim próprio e ao mesmo tempo ter pena de mim próprio não era uma contradição para mim, na época).
Então, vingava-me: solteiro e bom rapaz, livre e alodial, fruto apetecível para meninas casadoiras e não só, atravessei uma época mitológica em que namorei todas as meninas “namoráveis” de determinada região Sul (se me escapou alguma, aqui e agora peço desculpa e prometo que na próxima incarnação não escapa).
A minha vida era um virote, andava sempre em grandes correrias para alcançar as namoradas a tempo e horas.
Estava na moda uma canção dos Eagles, “Take it to the limit”.
Imaginem então que a minha loucura inconsciente juvenil me levava a cruzar as variadíssimas estradas do sul (na altura não havia auto-estradas) em alta velocidade, num bom carro, a ouvir aos berros o “Take it to the limit” e a levar efectivamente ao limite as loucuras na estrada.
Não sei se sabem, mas aquelas estradas eram mortíferas – todos os dias havia acidentes horríveis com mortos e feridos por todo o lado.
No meio de tal confusão dantesca, e apesar de ser um louco, sobrevivi.
Não é surpreendente ?

Cá vai a letra da canção

Take it to the limit
(Eagles)

All alone at the end of the of the evening
And the bright lights have faded to blue
I was thinking ’bout a woman who might have
Loved me and I never knew
You know I’ve always been a dreamer
(spent my life running ’round)
And it’s so hard to change
(can’t seem to settle down)
But the dreams I’ve seen lately
Keep on turning out and burning out
And turning out the same

So put me on a highway
And show me a sign
And take it to the limit one more time

You can spend all your time making money
You can spend all your love making time
If it all fell to pieces tomorrow
Would you still be mine?

And when you’re looking for your freedom
(nobody seems to care)
And you can’t find the door
(can’t find it anywhere)
When there’s nothing to believe in
Still you’re coming back, you’re running back
You’re coming back for more

So put me on a highway
And show me a sign
And take it to the limit one more time

Take it to the limit
Take it to the limit
Take it to the limit one more time

domingo, 4 de março de 2007

Contos Estelares - IX

Capítulo III

Rumo a Andrómeda


A princípio quase não se deu por nada, mas a nave Poseidon tinha acabado de partir para a grande viagem.
Como viajava próxima da estação espacial, ambas à velocidade da luz, a desaceleração da Poseidon só longos momentos depois de ser accionada foi realmente percepcionada – muito lentamente, a nave afastava-se da estação, ficando para trás.
A Poseidon tinha que se afastar bastante da estação antes de accionar os motores Erkhart, por razões de segurança; a estratégia era deixar-se ficar para trás algumas dezenas de milhares de quilómetros e assim se foi fazendo.
Dois dias-padrão depois a estação espacial era já um pontinho luminoso confundindo-se com as estrelas à distância.
“Atenção, estação, daqui Poseidon requisitando relatório”, ouviu-se a voz de Neves na sala de comando da estação.
“Estação espacial em linha e falando” respondeu Marta, “tudo normal e dentro do previsto – a vossa nave já só pode ser vista através de computação de imagem, aqui na estação prossegue a rotina”.
“Como previsto, vamos entrar em velocidade hiper-luminosa – assim que entrarmos em hiper-luz só poderemos comunicar com as limitações do interface Erkhart”, prosseguiu Neves.
“Todos preparados aqui na estação”.
Neves manobrou a Poseidon de forma a que esta ficasse com o extremo da proa voltado para Andrómeda até estabilizar a nave nessa direcção.
“Nave estabilizada, atenção à tripulação, parar toda a actividade, deitar nas camas dos camarotes dentro de meia hora ou em alternativa nos nichos de aceleração da sala de comando”, comandou Neves pelo intercomunicador.
Todos os astronautas preferiram assistir à aceleração na sala de comando.
“Atenção, vai começar a hiper-velocidade”.
Sentiu-se uma poderosa força que colava literalmente os astronautas aos nichos, ao mesmo tempo que um ruído quase em ultra-som se fazia sentir mais e mais, aumentando o volume à medida que a velocidade aumentava.
A certo momento estava uma barulheira infernal, com os astronautas esborrachados contra os nichos.
Subitamente ouviu-se como que um tiro de canhão e voltou o silencio, desaparecendo gradualmente a sensação de velocidade.
Mas os visores não mentiam – indicavam já o algarismo 20, o que significava que estavam a 20 vezes a velocidade da luz – 300.000 km por segundo vezes 20 – 6 milhões de Km por segundo !
“Todos se sentem bem ?”, indagou Cleópatra, que tinha junto às suas outras funções a de encarregada do departamento da saúde.
Todos se sentiam bem, tirando algumas palpitações já previsíveis originadas pelo barulho e pela sensação de aceleração que tinham experimentado.
Quando estabilizou a sua hiper-velocidade a nave já tinha deixado para trás há muito a estação, que ultrapassara pouco depois de ter iniciado a aceleração.
Os astronautas entreolharam-se com alguma timidez – a proximidade física era coisa a que estavam pouco habituados nos últimos anos.
Nina dissipou a tensão com uma simples pergunta a Cem “sabes cozinhar outras coisas além da feijoada ? se quiseres fazer um petisco para a confraria creio que seria bem-vindo”.
“Claro”, respondeu Cem, "dêem-me meia horinha e já vos apresento coisa boa” e saiu para a cozinha.
Meia hora depois soou o ding-dong do chamamento ao refeitório, de onde vinha um cheirinho a petisco iniludível.
“Resolvi apresentar-vos um petisco especial, um caril de soja vegetariano a que pode ser acrescentado condimentação diversa”.
Todos comeram, com uma canção dos Bee-Gees em fundo ("I started a Joke"), preparando-se para a solidão que vinha a seguir, pois estava programado que naquela fase cada um iria para o seu camarote e tentaria dormir tudo quanto pudesse.
(continua)

Contos estelares - VIII

Estação espacial
Preparando a grande viagem

Os cinco astronautas concluíram rapidamente os cálculos necessários: era preciso que as quatro naves se aproximassem o suficiente para se poderem mudar pessoas das naves, ficando três delas firmemente ligadas entre si, constituindo uma estação espacial.
A Poseidon, onde viajavam Augusta, Marta e João, seria a única nave a não estar ligada, pois seria nela que os astronautas se deslocariam para Andrómeda já que era a única que dispunha de propulsão Erkhart.
A estação espacial ficaria a vogar apenas à velocidade da luz, apontada a Andrómeda.
As naves Histórica (de Funes), Mariposa (Cleópatra) e Atlântida (Cem) foram aproximadas a menos de 50 metros e começou o delicado trabalho de construção das condutas através das quais iriam comunicar fisicamente; foram feitas várias mangas, de uma substância apelidada de flexiaço, que ligava as escotilhas mais largas de cada nave.
Felizmente todas eram relativamente contemporâneas, todas apresentando ganchos e cavilhas de atracagem normalizados, facilitando a tarefa da sua junção física.
Foi necessário acordar João e Marta para ajudarem nos trabalhos de atracagem das fuselagens; ponderou-se que eles teriam de ser acordados de qualquer forma, pois seriam eles a ficar aos comandos da estação.
Implicitamente foi assumido que quem se deslocaria a Andrómeda na Poseidon seriam Augusta, Neves, Cleópatra, Funes e Cem.
Algumas questões ficaram por resolver deliberadamente: por exemplo, sabia-se que a Poseidon iria demorar 5 anos a chegar a Andrómeda viajando a 20 vezes a velocidade da luz, pelo que punha a questão: deviam ou não os astronautas ou alguns deles entrar em pseudo-sono durante esse período ?
Funes e Cem declararam logo que não pretendiam dormir.
As suas companheiras de viagem deixaram a questão para deliberação posterior.
A Poseidon tinha acomodações e espaço mais do que suficiente para os cinco, além de amplos recintos comunitários – auditório, ginásio, biblioteca, refeitório com uma grande cozinha, e até um pequeno lago artificial com uma cascata onde era possível simular-se um banho de rio.
Os seus camarotes eram luxuosos (ou não fosse a nave preparada pelas super-poderosas Matriarcas da Terra), todos dispunham de jacuzzi e cama com hidromassagem.
Fiel às suas raízes espartanas e gostando de um colchão especialmente duro, Cem aumentou a tensão interna do seu colchão, tornando-o mais rígido.
As astronautas não mexeram nos comandos centrais dos seus camarotes – eles estavam todos regulados para todo o luxo feminino que a tecnologia podia proporcionar e não valia a pena fazer alterações.
Funes limitou-se a reivindicar o uso sem limites dos ficheiros da biblioteca para as suas pesquisas e registos históricos, no que todos concordaram.
Cada um dos cinco candidatos à grande viagem se mostrava gentil e paciente para com todos os outros, pois seriam co-habitantes de um espaço reduzido durante 10 anos, dependendo a sua sobrevivência de todos.
Por consenso foram distribuídas as tarefas de cada um:
Funes ficou encarregado da biblioteca e da central dos arquivos “melindrosos” (só mais tarde se falará deles).
Augusta Nina ficou encarregada do auditório e da manutenção geral da nave.
Cleópatra ficou com todas as tarefas inerentes ao Livro de Bordo e ao Manual de Bordo, bem como encarregada da estratégia geral da nave.
Neves assumiu a responsabilidade de velar pela correcção de rumo da nave e de todas as outras acções de navegadora, incluindo todos os cuidados especiais com combustível e perecíveis.
Cem ficou encarregado da cozinha e refeitório, encargo que aceitou com a única condição de não haver “fast food” às refeições, ficando também responsável pelo computador central de bordo e pelo computador redundante.
Treinaram intensivamente as suas respectivas áreas.
Em 3 meses a estação espacial estava acabada e a viajar à velocidade da luz e todos os preparativos da nave Poseidon estavam feitos e completados.
Os motores Erkhart foram revistos, lubrificados e testados.
Ia começar a grande viagem pela hiper-luz.
(continua)

sábado, 3 de março de 2007

Contos estelares - VII

"A máquina enlouqueceu", exclamaram mais uma vez as três, incrédulas.
No visor do computador apareceu outra mensagem:

“Como mulheres (...) que são, as senhoras julgam que o computador enlouqueceu, naturalmente.

Fui programado para aceitar contingências dessa natureza.

Há uma alternativa à nomeação de um homem-chefe: acordarem os dois adormecidos qualificados (Funes e Cem) e aceitarem-nos como vossos pares em todos os debates e discussões que se vão seguir”.

“Bom, continuo a pensar que a máquina está com algum problema, mas esta alternativa já me parece mais razoável”, disse Cleópatra.

As outras duas ex-Belas Adormecidas concordaram.

Resolveram pois acordar os dois adormecidos, o que fizeram acto contínuo.

“Que fome !”, exclamou Cem espreguiçando-se “bolas, foram-me acordar quando eu estava a sonhar com iguarias gastronómicas inexprimíveis”.

“Também tenho fome” declarou sucintamente Funes.

“Bom, mas é necessário discutirmos”, obtemperou Neves.

“Desculpem lá, minhas Senhoras, mas eu sou incapaz de discutir o que quer que seja, de barriga vazia e com esta fome ! Posso oferecer-vos uma feijoada com todos, feita à transmontana, que poderei confeccionar aqui e enviar-vos pelo transpositor de matéria”.

“Também tenho fome” repetiu igualmente sucintamente Funes.

“Funes, V. está a ficar um bocadito monocórdico”, chasqueou Cleópatra, “mas o melhor é não perdermos mais tempo e conciliar tudo – Cem, em quanto tempo consegue fazer a feijoada ?”

“Em uma hora posso ter tudo pronto”.

Os outros concordaram em esperar pela dita.

Uma hora depois começaram as chegar as feijoadinhas quentinhas às várias naves, acompanhadas por um arroz branco malandrinho e torresmos transmontanos para servir à parte; em anexo, chegaram também umas garrafinhas de vinho tinto “Dão Meia Encosta”, para “acompanhar à missa” e um piri-piri especial made in Cem.

Todos comeram e beberam excelentemente, tendo mesmo Augusta declarado que há muito não comia uma feijoada tão bem apurada, e – pasme-se ! – com a concordância de todas as outras mulheres.

“Cem, como é que V. faz isto ?”, perguntou Funes entusiasmado.

“Oh, oh, meu amigo, são alguns anos de escravidão na cozinha de algumas mulheres que conheci na velha Terra – cheguei à conclusão de que a única forma de elas me darem alguma liberdade era alcançar-lhes as barriguinhas, desenvolvi esta técnica de feijoada e nunca mais tive problemas – se as estimar bem, com bons cozinhados, elas dão-me uma margem de liberdade de movimentos que nunca conseguiria ter como simples técnico qualificado, mesmo da classe A”.

“Já todos comeram ?”, indagou Cem.

Já todos tinham comido e bebido.

Os cinco iniciaram então uma reunião em videoconferência, debatendo as hipóteses em cima da mesa.

Cem declarou pouco depois que achava a 1ª hipótese a mais susceptível de sucesso, desde que combinada, na medida do possível com a proposta de Augusta.

Funes declarou que concordava, desde que as naves interligadas tivessem sistemas de privacidade que inviabilizassem qualquer intromissão na vida privada de cada um.

Neves e Augusta concordaram com as sugestões e Cleópatra sempre estivera de acordo com a solução gizada.

Havia muito a fazer.

(continua)

John Mayall



Aqui vão duas canções excepcionais do "Pai dos Blues" british.




Room to Move e Double Crossing Time

sexta-feira, 2 de março de 2007

Nina bloqueada

Então Ni, já tens o problema resolvido ?
Se bem compreendi, o Blogger.com bloqueou-te o blog alegando que ele tinha todo o ar de ser "spam", não é verdade ?
Não compreendo de todo como é que um blog como o MomentUS pode ser confundido com um sítio de "spam".
Espero que a coisa melhore.
Podes sempre vir aqui e deixar os recados que entenderes.
Um abraço e boa sorte,
Cem

Contos Estelares - VI

Cleópatra sentou-se no sarcófago criogénico, que estava de tampa aberta, e o seu olhar dirigiu-se logo para o calendário, apercebendo-se de que tinha estado em hibernação muito pouco tempo.
A seu lado João, Marta e Augusta dormiam o sono dos justos.

Sabia que nas respectivas naves Funes e Cem dormiam também.
Sabia também que provavelmente teria sido Neves a acordá-la, a não ser que algum acidente tivesse accionado o despertar automático.
Pouco depois Neves juntou-se-lhe em videoconferência, ambas já nas respectivas salas de comando das suas naves.

Neves explicou a Cleópatra o que tinha acontecido e a razão porque a tinha acordado.

Explicou que tinha configurado várias hipóteses para a solução do problema que enfrentavam:

1. Usar a nave em que estavam, Poseidon, que tinha propulsão Erkhart e que podia em poucos anos fazer a viagem a Andrómeda e voltar (a propulsão Erkhart permitia viagens a 20 vezes a velocidade da luz; em cerca de 10 anos-padrão a Poseidon conseguiria deslocar-se 200 anos-luz, ou seja, podia fazer uma viagem de ida e volta a Andrómeda).

2. Deixar a expedição prosseguir apenas à velocidade da luz, tentando descobrir um sistema habitável antes de Andrómeda.

3. Obrigar os computadores a fazerem um “brainstorming” por forma a apurar quais os sistemas estelares próximos mais prometedores em termos de habitabilidade (opção perigosa pois era frequente nestas tentativas um ou dois computadores não aguentarem a carga de terabytes envolvida e rebentarem os discos e as memórias centrais.

4. Combinar as partes compatíveis das hipóteses 1, 2 e 3.

Neves deixou bem claro que a sua preferência tendia para a hipótese 3 – computer brainstorming.

Cleópatra disse-lhe que precisaria de pelo menos 24 horas de estudo e reflexão para se sentir com o à vontade de formular uma opinião.

Meteu-se na sua cabine manejando o computador portátil, fazendo cálculos e mais cálculos, tudo a funcionar sobre o sistema operativo Windows.

Passado umas horas voltou à sala de comando e requisitou um novo portátil equipado com outro sistema operativo, o Linux; depois de o receber, trabalhou mais umas horas, dizendo volta e meia uma imprecação em surdina.

Finalmente, cansadíssima e insone, voltou a ligar a videoconferência, contactando Neves.

“Minha amiga, estamos com um problema”, disse, “creio que a tua proposta é inadequada, segundo os meus cálculos a hipótese 1 é a mais prometedora, oferecendo 80% de margem de sucesso, enquanto nenhuma das outras ultrapassa os 60% de probabilidades”.

“Temos de acordar o terceiro elemento”, constatou Neves, “mas quem ?”

“Simples”, respondeu Cleópatra, “isto é um problema sério, tem que ser resolvido pelos mais capazes e os mais capazes somos nós, as mulheres, como concordarás – a nossa melhor mulher adormecida, pela sua sagacidade e pela sua experiência é Augusta Nina”.

“Seja”, anuiu Neves, “mas por favor, depressa, porque estamos a chegar a um eixo axial importante da viagem e a eventual mudança de eixo tem que ser decidida a curto prazo”.

Accionaram o despertar de Augusta.

Passado uma hora já Augusta estava desperta e inteirada do problema que enfrentavam.

“Cabe-me então a mim desempatar”, constatou Nina, olhando preocupada para o visor de videoconferência – “oiçam lá, e se eu tiver uma quinta opinião não coincidente com nenhuma das vossas ?”.

“É que tenho mesmo, caras amigas, a minha opinião é a de que perante todo este imbróglio a nossa melhor hipótese de sucesso é a ligação física das quatro naves e a construção de uma estação espacial que apontaremos ao sistema solar mais próximo, mas qual ?”

“Bom, como sabemos da mitologia, a figura formada pelas estrelas próximas à constelação de Cepheus lembra a duma figura humana sentada num trono – só que de cabeça para baixo. Para os gregos, isso representava a punição por um crime severo e logo associaram essa constelação ao mito de Cassiopéia: a vaidosa rainha da Æthiopia que comparou sua beleza à das Nereidas, filhas de Poseidon. Como punição, os deuses exigiram que sua filha, Andrômeda, fosse sacrificada ao monstro Cetus (uma besta similar a uma baleia) para que seu país não fosse inundado pelas ondas de Poseidon”.

“De cabeça para baixo estou eu a ficar, Nina”, disse Neves, “não estou a compreender onde queres chegar”.

“Bom, eu cá já nem sei se tenho cabeça”, suspirou Cleópatra, “que havemos de fazer ?”

Concordaram em consultar o Manual de Bordo, indagando qual o procedimento no caso de as três terem opiniões divergentes, introduziram os dados no computador central da nave de Nina (o mais poderoso de todos), o qual pouco depois despejou a resposta: "o sistema determina que três mulheres discordantes são demasiado teimosas nas suas opiniões, levando a um perigoso desequilíbrio de segurança, a solução indicada é elegerem um homem dos adormecidos qualificados e nomearem-no vosso chefe máximo - só um homem poderá lidar com 3 mulheres ao mesmo tempo sem se envolver em discussões inultrapassáveis".

"A máquina enlouqueceu", exclamaram as três, incrédulas.
(continua)

Cleoseta


É da minha vista ou a minha amiga Cleópatra pediu para lhe fazerem uma seta com o nome do blog ?

Fotheringay





Aqui.

quinta-feira, 1 de março de 2007

Contos Estelares - V


Capítulo II – Viagem pelo éter infinito

Neves olhou para a maquinaria da cabine que a rodeava e pensou como se enganara.
Estivera convencida de que o longo período de solidão que tinha começado iria ser entediante e chato, quando, pelo contrário, estava sempre a ser solicitada para as mais diversas tarefas.
Naquele momento acendeu-se a luz do robot Explorador, indicando mais uma vez que havia à frente um sistema solar possivelmente habitável; já era a 5ª vez que isso acontecia, nas restantes quatro vezes verificou-se rapidamente que era alarme falso.
Neves saltou e foi examinar o visor, onde já se estava outra vez a formar a mensagem “Demasiada radiação – impossível a vida humana”
Mais um falso alarme !
O grupo de naves há muito que tinha ultrapassado Alfa do Centauro, que estava a cerca de 4,2 anos-luz da antiga Terra – todos os planetas antes prometedores tinham sido contaminados pela implosão do sol terrestre, pelo que agora só havia uma coisa a fazer, tal como previamente combinado com os restantes: manter a formação de naves e seguir em direcção da nebulosa de Andrómeda onde a estrela Alfa de Andrómeda tinha à sua volta planetas prometedores; esta estrela estava a 97 anos-luz da antiga Terra e havia poucas possibilidades de a radiação libertada pela implosão do sol a ter afectado; ela e a sua gémea eram cerca de 200 vezes mais brilhantes que o sol e no seu núcleo registavam-se temperaturas da ordem dos 13.000 graus Kelvin.

97 anos-luz !
E as naves só podiam avançar à velocidade da luz, pois algumas delas não ultrapassavam tal velocidade – se queriam seguir juntos, os astronautas teriam que adoptar a velocidade dessas naves.
Neves ponderou o que deveria fazer.
Os outros astronautas estavam em hibernação, com os processos de envelhecimento praticamente parados; daí a 97 anos estariam mais ou menos na mesma.
Mas Neves estaria com mais de 120 anos e mesmo com as técnicas mais modernas de retardamento do envelhecimento estaria uma idosa muito mirradinha por essa época.
Lembrou-se a despropósito de uma frase do “Corsário Negro” de Emílio Salgari, que tinha lido na adolescência: “como resolver dilema tão atroz ?”
Mierda, mierda, pensou, estou metida numa embrulhada dos demónios.
Não, aquilo não podia ser assim, alguma coisa estava a falhar de certeza.
Neves introduziu os dados num computador portátil e esperou os resultados durante um bom bocado.
Finalmente apareceram: “Secção 3-C do Manual de Bordo, Capítulo 32, Versículo 10”.
Clicou no link respectivo e apareceu a regra do manual: “A nenhum membro da tripulação é lícito tomar decisões isoladamente que impliquem um período de tempo de adormecimento dos restantes superior a 10 anos; nessa eventualidade o tripulante deve acordar um adormecido qualificado e aconselhar-se com ele sobre a decisão a tomar; se as opiniões dos dois não forem idênticas ou razoavelmente semelhantes, deverão acordar um terceiro membro da tripulação, que desempatará”.
Bale !, suspirou Neves com alívio.
Decidiu acordar Cleópatra.

(continua)